segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

O mundo inteiro ou nada

— O que você faria se soubesse que pessoas fazem apostas pra ver em quanto tempo você vai fracassar? —disse ela em um tom de profunda decepção.
— Isso não é normal? —perguntei mesmo já sabendo a resposta.
— Não sei em que ponto isso pode ser normal —ela respondeu— eu ouvi isso da minha própria mãe. Ela disse que lá na minha cidade as pessoas estão apostando pra ver em quanto tempo eu fracasso.
— Há pessoas, mesmo no silêncio, torcendo pelo nosso fracasso o tempo todo. Até de maneiras inconscientes e inocentes —eu disse.
— Eu não deveria nem me surpreender, né? —ela disse, ainda decepcionada— não deveria esperar mais nada de ninguém ali.
— Eles são os responsáveis por qualquer coisa que aconteça? Não. Eles podem falar e apostar o que quiserem, você ainda está aqui —disparei— e tomou uma decisão que muitos não teriam coragem, está procurando um lugar onde pode ser feliz.
— É difícil ver o quanto isso faz mal pra minha mãe —ela disse, olhando no fundo dos meus olhos.
— Todos tem coragem pra criticar as decisões e os riscos que as pessoas escolhem pra si —eu disse, retribuindo o olhar.
— Eu não me importo —ela disse baixo, quase desistindo da conversa.
— Poucos tem a coragem de fazer algo por si mesmos e procurar a própria felicidade aceitando a possibilidade de tudo dar errado —insisti.
— É justamente isso —ela disse empolgada— a felicidade alheia incomoda quem não tem coragem de enfrentar o que for pra buscar a própria.
— Você sabe por que? —eu provoquei.
— Por quê? —ela perguntou interessada.
— Porque ninguém consegue ficar feliz por outra pessoa —disse. 
— Como assim? Isso é triste —ela disse, mais uma vez decepcionada.
— Se eles conseguissem apreciar um pouquinho dos seus resultados —continuei— reconhecer só um pouquinho da coragem de ter tomado as decisões que te trouxeram até aqui, não estariam torcendo pelo seu fracasso.
— Onde você quer chegar? —ela questionou.
— Eles torcem pelo seu fracasso porque o fracasso alheio, diferente da felicidade, pode ser reconhecido e apreciado —disse sem pensar duas vezes.
— Pelo menos estou aqui. É uma vista linda —ela disse abrindo um pequeno sorriso.
— É, felizmente eu estou aqui pra ver também. Mas sabe que isso tem tudo a ver com essa conversa? —provoquei mais uma vez.
— Tem? O quê? —ela perguntou, mais uma vez interessada.
— Nenhuma das pessoas que está torcendo pelo seu fracasso está vendo essa mesma vista agora —disse, com um sorriso forçado no rosto.
— Com certeza não. E acredite, eu sei que queriam estar... —ela disse segura de si.
— Sabe, eu tenho algo em comum com todas essas pessoas que torcem pelo seu fracasso —disse, em um tom de desabafo.
— E o que é? —ela perguntou.
— Eu também não sou corajoso —admiti.
— É sim. Está guardado aí dentro pra aparecer na hora certa —ela disse, com seu jeito otimista de ser.
— Ah é? —provoquei pela última vez.
— É. —ela disse sorrindo.
— Certo —disse, fingindo que havia acreditado— mas então, o que você quer pra sua vida?
— O mundo inteiro ou nada —ela disse.
— O mundo inteiro ou nada —repeti.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Os colecionadores de despedidas

No sentido literal, somos todos colecionadores de despedidas, afinal de contas, pessoas saem e entram de nossas vidas o tempo todo, o que é, inclusive, responsável por mudanças drásticas, sejam elas boas ou ruins. Mas esse texto não é sobre pessoas que passaram por despedidas cheias de lágrimas de saudade e promessas de reencontro. Os colecionadores de despedidas, na verdade, colecionam despedidas que não aconteceram.

Alguns anos atrás, uma amiga, que na época era muito próxima de mim, se mudou com a família pra outra região do estado. Nós continuamos nos falando normalmente por um tempo mas, naturalmente, fomos ficando mais distantes até que paramos de nos falar. Mas foi algo que aconteceu  gradativamente e de ambas as partes. Não há nada de errado entre nós dois, tanto que nos falamos algumas vezes desde então e foram conversas muito legais. Sem um clima estranho, sabe? As circunstâncias da vida fizeram nossa amizade mudar e depois se tornar inviável, o que não quer dizer que não podemos nos falar e tudo continuar bem.

Você deve estar se perguntando, por que eu não procuro reatar nossa amizade ou falar com ela com mais frequência já que está tudo bem entre nós dois? Por que eu não tenho essa vontade? Bem, isso vai soar um pouco cruel de tão realista, mas é porque ela não faz falta pra mim. Não faz diferença. E acredito que, salvando raras exceções em que estamos passando por momentos delicados ou difíceis, quando as pessoas fazem diferença e fazem falta nós corremos atrás delas ou tomamos posturas diferentes ao invés de apenas deixar a distância aumentar e aceitar que a relação caminhe na direção do inevitável. Porque há algo que você pode chamar de saudade ou diferença que vai abrindo um buraco quando esse tipo de situação evolui com relação a alguém que é importante pra nós.

É claro que as vezes, as pessoas são muito mais relevantes pra nós do que nós somos pra elas, e os colecionadores de despedidas compreendem bem as causas e as consequências disso. O irônico é que eles acabam desenvolvendo o medo de novos encontros, ou seja, conhecer novas pessoas. A ideia que acaba se instalando na cabeça deles é bem simples: quanto menos pessoas a gente conhece, menos pessoas pra ir embora. Sem contar os casos em que essas pessoas passam a não se despedir também. A desaparecer da vida das outras porque um dia alguém as ensinou que despedidas são dispensáveis, e podem até ser pra algumas pessoas, mas não pra aquelas que ainda nos querem em suas vidas porque fazemos alguma diferença. Eu não estou aqui pra criticar pessoas que vão embora e cometem seus erros, porque todos nós cometemos. Estou aqui pra criticar as pessoas que cometem ou não seus erros mas que vão embora sem dizer adeus. Exatamente isso, pessoas que vão embora sem dizer adeus.



segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Quando chove

Quando chove
Desse lado, a cidade envolve tudo e suas ruas preferidas ficam alagadas
E eu te avisei
Não confie demais nessas pessoas que dizem valorizar as pequenas coisas da vida
Porque, assim como você,
As pequenas coisas da vida são tudo o que elas não conseguem enxergar
Ou achou que não aguentaria até o momento de tomar as decisões difíceis?
Bem, eu tenho uma péssima notícia pra te dar,
Eu não faço ideia do que se passa pela sua cabeça mas
Você alugou uma casa no fundo do buraco mais escuro e
Se convenceu de que essa não é a razão pela qual você não vê mais o sol
Quando você acordar,
A sua música preferida já não vai mais estar tocando nas rádios
Aquele filme da sua vida pelo qual esperou tanto tempo já vai ter saído de cartaz
Não será mais Primavera
Mas essas mesmas pessoas que fingem valorizar as pequenas coisas da vida
Ainda estarão presas a você como sanguessugas
Até que você se torne tudo o que você se comprometeu a desconstruir
Porque quando chove daquele lado da cidade, como disse Machado de Assis,
Há pessoas que choram por descobrir que rosas têm espinhos
E pessoas que sorriem por descobrir que espinhos têm rosas.


segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

O prefácio da guerra

Não me lembro direito daquele dia
Mas lembro da sensação de acordar como se
O meu corpo estivesse em chamas
Como se eu tivesse dormido por semanas
Ou talvez anos
Doía como uma cirurgia sem anestesia
E quem teria a coragem de dizer que não era uma?
Certamente não eu
Mal consegui levantar da cama
E quando o fiz eu desejei que não tivesse conseguido
Não respirava direito ou
Andava com as duas pernas ou
Pronunciava as palavras que eu sei que não teriam mudado nada
Porque nunca fizeram nenhuma diferença e
Talvez esse texto se torne mais claro pra você
Quando perceber que
As maiores batalhas são travadas por trás das aparências
São travadas por aquilo que a gente não tem medo que quebre
Até estar quebrado
E não temos medo de perder
Até termos vontade de encontrar
Então aproveite cada segundo antes que 
Isso vire uma tragédia.


segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Cherofobia

Eu gostaria de fazer uma pergunta a vocês.  A pergunta em si é simples e pouco tendenciosa mas eu gostaria de saber o que ela significa pra você. Amanhã é um dia a mais ou a menos? Uma amiga me fez essa mesma pergunta dias atrás. E não, não leia esse texto achando que ele contém uma resposta, porque se trata exatamente do contrário. Ele não é sobre as possíveis respostas pra essa pergunta, mas sobre vários pontos de vista que não conseguiram me satisfazer como resposta. Apesar de não ter chegado a uma resposta, eu reconheço que qualquer resposta satisfatória pra essa pergunta depende de duas coisas: a maneira como você encara a sua própria vida e a maneira como você encara a vida enquanto fenômeno. Mas antes disso, vamos deixar esse existencialismo barato de lado e vamos pra alguns fatos. Biologicamente, amanhã é um dia a menos. Nossas células vão demorando cada vez mais pra se dividir e substituir as que vão morrendo. Ou seja, estamos morrendo lentamente desde o momento em que nascemos e temos que aceitar isso. Mas não, eu não pretendo tornar isso uma dissertação niilista sobre a inevitabilidade da morte ou fazer todos nós ficarmos tristes pensando sobre o quanto é ruim ter essa certeza. Eu quero partir desse aspecto biológico pra chegar na questão da pergunta. Os que não sabiam, sabem agora. Sinto muito por ter sido eu a contar esse spoiler cruel da vida, vocês precisam ser fortes.

Então, aceitando porém deixando de lado a inevitabilidade da nossa morte, vamos voltar pra pergunta. Não apenas voltar, vamos tentar dar uma resposta provisória pra ela. Se alguém está feliz ou satisfeito com sua vida, o amanhã é um dia a mais pra viver essa vida satisfatória ou um dia a menos pra vivê-la? Acho que você entendeu onde eu quero chegar. O fator satisfação ou felicidade não nos ajuda a encontrar uma resposta, na verdade, é quase como repetir a pergunta inicial. Então vamos questioná-lo também. O que é um momento feliz ou um estado de felicidade? É um momento que você não quer que acabe. São aqueles momentos que se dependessem da sua vontade, continuariam pra sempre. Você viveria eternamente neles. E apesar da eternidade ser uma noção de tempo, ela atua exatamente como o contrário nesse caso. Porque se um momento feliz é um momento que você gostaria que não acabasse, ele é também algo que está tentando superar ou "se livrar" dessa própria ideia e contexto de temporalidade. Se os dias felizes pudessem falar, eles diriam que não importa se é um dia a mais ou um dia a menos, desde que seja um dia como eles. Daí que vem aquela expressão popular "O tempo voa quando a gente se diverte". Não é que o tempo voe, nós apenas não nos importamos se as horas ou dias estão passando ou não quando estamos felizes.

Entretanto, se você não está feliz ou satisfeito com sua vida, tenho certeza que se importa se é um dia a mais ou um dia a menos. Consegue contar e sentir cada segundo passar. Cada dia. Cada gota de chuva que eventualmente cair do céu. Porque aí o fato do tempo estar passando importa. Você se pergunta quanto tempo ainda vai ter que viver dessa maneira e isso só faz parecer que o tempo está passando ainda mais devagar. E sim, a ausência do fator mencionado anteriormente também não nos ajuda a encontrar uma resposta. Porque se alguém está infeliz ou insatisfeito com a própria vida, o amanhã é um dia a mais pra que alguma coisa mude, é um símbolo de esperança, ou é um dia a menos pra viver essa vida infeliz que não tem chance de melhorar? Continuamos com perguntas muito parecidas, com a diferença de que esse alguém, diferente do primeiro alguém, se importa com os dias que está ganhando ou perdendo. Quer dizer, vamos tentar imaginar que uma bruxa lançou um feitiço em você e esse feitiço prendeu você em um ciclo no qual você vive exatamente o mesmo dia infinitas vezes, um após o outro. Você acorda da mesma maneira. Come as mesmas coisas. Encontra as mesmas pessoas. Tem as mesmas conversas. Ouve as mesmas músicas. Tudo exatamente igual. É realmente certo dizer que dentro desse feitiço o tempo está passando? Que você está perdendo ou ganhando dias? Os dias e noites chegam e vão embora, mas a ideia de tempo nesse feitiço é a mesma que temos aqui fora? Eu gosto de pensar que não.

Não consigo concordar ou simpatizar com o vício do ser humano de ter que enquadrar todas as coisas em uma das opções de uma dualidade. Que condição humana detestável. Não consigo aceitar a ideia de que todos os dias têm que ser ou dias a mais ou dias a menos. Por que não podem ser apenas dias? O que acontecer, o que fizermos e o que sentirmos pode determinar as particularidades de cada um deles. Não vejo a necessidade de arrastar todos os dias ou pra um lado ou pro outro, como se tudo na vida fosse tão absoluto e constante assim. Sabemos que não é. Há dias felizes. Dias tristes. Dias que gostaríamos de esquecer. Dias que gostaremos de lembrar pro resto das nossas vidas. Dias que preferimos que nunca tivessem acontecido. Dias que queremos que aconteçam. Mas há também apenas dias. Dias onde não acontece nada demais. Dias onde a gente acha que não acontece nada demais. Dias, sabe? Não precisamos ser escravos de uma noção tão limitada de tempo assim. A felicidade, o amor, a tristeza e tantas outras coisas são atemporais. Talvez nós mesmos sejamos atemporais, porque não morremos quando deixamos de existir. Continuamos vivos nas memórias e nos sentimentos de muitas pessoas. Portanto, não tenha medo dos dias que virão ou dos dias que passaram. Eu acredito naquela frase do Camus, a grandeza do ser humano consiste na decisão de ser mais forte que a condição humana.


terça-feira, 24 de novembro de 2015

Dezessete e cinquenta e cinco

Ás vezes gostar de alguém pode parecer
Arrancar e mastigar um pedaço de si mesmo
Em geral um daqueles pedaços que nós não gostamos
Cuspir ou engolir com vontade e
Esperar que outra pessoa coloque um dela no lugar
Porque jogar a responsabilidade do improvável que é te completar
Nas costas de alguém é muito mais fácil do que
Segurar as mãos dessa mesma pessoa e dizer
O quanto você adora o outro mundo que acabou conhecendo
Através das palavras que ela diz e das histórias que ela conta
Porque é tudo uma questão de se permitir
Regar um cantinho do jardim que existe dentro de você 
Todos os dias
Não ter medo da luz do sol que vai passar entre as árvores
Das naturais inconstâncias
E das flores que vão desabrochar ali
Reconhecer que alguém ultrapassou os seus muros
Como se eles não existissem
E que te faz bem
Não um bem qualquer desses que te ilude através dos teus caprichos
E que pode te trair
Mas um bem que existe desde o primeiro momento em que
Você e essa outra pessoa estiveram em sintonia
Desde o primeiro momento em que o seu olhar se encontrou com o dela
E você percebeu que essa pessoa te enxerga pra além dos teus olhos
Que vocês alcançam lugares um no outro que 
Pareciam não existir antes disso
E talvez não existissem mesmo
Porque você sabe que ela é o ser mais estranho e extraordinário
Que você já conheceu e
Você só quer cuidar dela e tornar algum lugar desse mundo
De preferência ao seu lado
Um lugar não apenas suportável pra ela
Mas um lugar que faça tão bem a ela quanto ela faz a você
Ou até mais
Porque você se tornou alguém melhor apenas por saber que
Alguém como ela existe
E você adora essa própria maneira dela existir e
Mesmo que a maioria não perceba tudo o que envolve
Ser ela
Você percebe e se encanta e
Deixando de lado todos os obstáculos
Ou seja lá o que for
Eu só queria dizer também que
São dezessete e cinquenta e cinco
E agora eu finalmente entendo porque a palavra saudade
Não existe em nenhuma outra língua
E se você acha exagero as coisas que eu digo ou escrevo
É porque não viu as que eu apago
Ou as que eu guardo só pra mim
Em algum lugar confortável aqui dentro
Onde há também uma plaquinha com o seu nome
Muitas estrelas no céu
E flores da cor e com o cheiro do seu cabelo.


segunda-feira, 16 de novembro de 2015

E se eu te disser que somos todos palhaços e médicos socando paredes?

- Boa noite. Eh, sem querer incomodar mas... por que você está socando essa parede com tanta vontade?
- Ah, oi. Não é nada.
- E quanto a essas mãos machucadas?
- Não é nada.
- Já que não vai me responder, me deixe ao menos contar uma história. Talvez você conheça. É a história de um homem que vai ao médico e diz que está deprimido. Diz que a vida parece dura e cruel. Diz que se sente sozinho e que tudo o que consegue sentir é vago e incerto. O médico diz que o tratamento é simples: há um famoso palhaço na cidade, assista ao espetáculo e você vai se animar. E então o homem começa a chorar e diz que ele é o tal famoso palhaço.
- Não estava esperando por uma história dessas. Mas o que isso tem a ver? Não estou deprimido.
- É, não está. Parece estar é transtornado. Mas a questão é que não acho que socar essa parede seja diferente do que o médico da história propôs ao homem.
- Quê? Ah cara, eu só pensei que eu podia ficar conversando com ela por horas sobre todas as coisas que nunca faremos juntos e todas as coisas que eu nunca vou poder dizer a ela.
- E quando soca essa parede, é uma parede que existe dentro de você ou dentro dela?
- Isso importa?
- Uhum.
- Eu poderia dizer que a parede existe dentro de mim, é o que me impede de esquecer o que sinto por ela. De sair dessa. Mas também posso dizer que a parede existe dentro dela, é o que impede ela de ser honesta comigo da maneira que eu sou com ela.
- Então vocês dividem essa parede.
- Parece que sim.
- E ainda assim você pretende derruba-la sozinho?
- Pretendo.
- E acha isso correto?
- Não sei. Onde você quer chegar afinal?
- Não quero chegar a lugar nenhum. Se eu quisesse, teria continuado a minha caminhada, não parado pra conversar com um cara transtornado socando uma parede em uma rua deserta em uma madrugada de sábado.
- Tá. Eu não sei se é correto. Precisa ser?
- Não, não precisa. Mas se derrubar essa parede fosse tão importante pra ela quanto é pra você, ou se pelo menos ela se importasse com você da mesma maneira que se importa com ela, ela não estaria aqui do seu lado ajudando a derruba-la?
-  Não tem importância. Ela não está aqui. Não sou uma prioridade pra ela do jeito que ela é pra mim.
- E você acha que quebrar os ossos das mãos vai trazer ela de volta?
- Não...
- Então.
- O que você quer que eu faça? Ela não vai voltar. Na verdade, ela vai, mas do jeito que ela quiser. E depois de um tempo ela vai embora de novo, sem avisar ou se importar. E eu não aguento mais isso. Está me corroendo por dentro e eu não consigo deixar pra lá. Não consigo esquecê-la ou fugir disso. Acha que eu sou um idiota por agir assim?
- Eu não sei o que aconteceu mas... não acho que você é um idiota. Eu tenho certeza.
- Como é?
- Nós todos apenas variamos de um pouco idiotas pra muito idiotas com relação ao amor.
- O que você quer dizer com isso?
- Eu quero dizer que todos nós merecemos que alguém quebre algumas paredes por nós, ou pelo menos tente. Todos nós merecemos alguém que esteja disposto a chorar por nós. A perguntar mil vezes se nós estamos comendo e dormindo direito. A sorrir conosco. A fazer as maiores loucuras sem hesitar.Você deve entender o que eu estou dizendo.
- Eu entendo sim... mas como eu vou saber se eu sou alguém assim? Como vou saber se eu sou uma dessas pessoas que merece estar ao lado dela?
- Você quer estar ao lado dela, não quer?
- Claro. É tudo o que eu mais quero no momento.
- Então já é um ótimo começo. Além do mais, você mesmo disse, ela sempre volta, não é?
- É, mas...
- Não é?
- É.
- Já se perguntou o porquê de ela sempre voltar?
- Não. Eu deveria?
- Não. Você não deve nada a ninguém, nem a ela.
-  Eu sei mas... sei lá, cara. Agora que você disse... por que será que ela sempre volta? Há algo em mim que ela não acha em nenhuma outra pessoa? Não dá pra saber.
- Por que você mesmo não pergunta a ela?
- Ela nunca responde as minhas perguntas. Não me conta as coisas. Às vezes eu sinto que não a conheço direito.
- Então comece pelas perguntas mais urgentes. Pergunte a ela porque ela não te conta e porque você sente que não a conhece direito.
- Não sei se eu consigo. Ela chama isso de independência.
- E você, do que chama?
- Não sei como responder essa pergunta. Mas por que?
- Talvez nem ela saiba como responder e por isso chama de independência. É uma palavra bonita de se usar nos dias de hoje.
- Agora que você comentou... é mesmo uma palavra fácil de usar contra alguém.
- E que não devia ser usada contra um alguém que se importa tanto com ela.
- É...
- Bem, então eu já vou indo. Boa sorte com a sua garota.
- Ei, espera. Por que parou pra conversar comigo? Quem é você? Isso está sendo uma das coisas mais bizarras que já aconteceram na minha vida.
- Eu não sou ninguém. Não quero ser ninguém.
- Ah, tá. Mas... a primeira pergunta...
- Por que? Bem, porque hoje é um daqueles dias em que chove dentro de casa.