A auto-afirmação e a exaltação de coisas triviais virou rotina nessa grande era da integração digital. E ao mesmo tempo acontece a venda de "verdades prontas" em busca do melhor rótulo possível. Porque é claro que o inteligente tira notas boas, o de cárater firme é confiável e o justo é supostamente aprazível. Uma pena que a maioria dessas características sejam difíceis de disfarçar ou encenar, se não todos poderíamos mudar de rótulo de acordo com a nossa vontade. No entanto, não é bem assim.
Não temos realmente controle sobre certas características. Apenas nascemos com elas. Nossa aparência, aptidão e outras coisas. Claro que isso é bem discutível, afinal são raras as coisas que o dinheiro não possa ajudar a mudar. De qualquer modo, a capacidade de julgar é algo tão presente na natureza humana quanto a própria capacidade de amar, de sofrer, de se decepcionar. É tão presente e absoluta quanto a própria consciência. E somos muito eficientes nisso.
O que acontece no mundo é como uma hierarquia de rótulos. A posição de cada um nessa hierarquia é decidida pelo valor de incontáveis váriaveis que tem pesos diferentes dependendo da pessoa. E houve o momento desconhecido na história em que os padrões de beleza, comportamento e consumo, bem como os significados fixos de sucesso vieram a tona. E são como parasitas dentro de cada um de nós. Todos temos consciência da existência disso, porém a gigantesca maioria não se importa ou simplesmente aceita de braços abertos. Sem questionar. Como deve ser.
Quando olhamos pra uma pessoa desconhecida, identificamos todas as variáveis que podemos. Em seguida seus valores e seus pesos de acordo com nada além de nossa própria perspectiva. E então se formam os rótulos em nossa cabeça. É claro que eles podem ser revertidos uma vez que a gente conheça os valores de outras variáveis que não conseguimos identificar de primeira, mas os parasitas costumam não deixar as pessoas admitirem isso.
E assim nos tornamos escravos da aparência, do ego. O dinheiro tornou-se o único Deus realmente onipresente e onipotente nesse mundo. E nós continuamos a elaborar nossa classificação de pessoas, mesmo sem perceber. Mesmo que elas não tenham culpa ou mérito por terem nascido do jeito que são. Mesmo que isso faça as pessoas se desprezarem. Mesmo que nem todos tenham as mesmas oportunidades. Mesmo que nem todos consigam se encaixar nessas regras cruéis. Os que se beneficiam disso, que tem motivos pra sorrir todos os dias e são consumidos pelos parasitas estarão presentes. São imortais e a realidade sempre irá conspirar a favor deles.
E então os que são capazes de reconhecer isso são como o câncer da realidade. Tumores inofensivos que serão todos eliminados por uma espécie de "Seleção Natural" que essa capacidade humana de julgar realiza. A maioria diz que lhes falta amor. Outros dizem que eles são solitários. Mas o que falta na verdade é capacidade de admirar o ser humano. Todo o resto se torna muito mais difícil sem isso. Eles morrerão logo. Nós damos peso a certas coisas que não fazem diferença de maneira tão inconsciente que eu tenho certeza que grande parte nem compreende sobre o que é esse texto. A ignorância deve ser mesmo irmã da felicidade.


Nenhum comentário:
Postar um comentário